A IDEOLOGIA, SUAS ORIGENS E PERSPECTIVAS
A
ideia de cultura nasce da análise das sociedades antigas, mas o conceito de
ideologia é um produto essencialmente moderno, pois antes da Idade Moderna as
explicações da realidade eram dadas pelos mitos ou pelo pensamento religioso.
Uma
das primeiras ideias sobre ideologia foi expressa por Francis Bacon
(1561-1626), em seu livro Novum organum
(1620). Ele não utilizava o termo ideologia, mas, ao recomendar um estudo
baseado na observação, declarava que, até aquele momento, o entendimento da
verdade estava obscurecido por ídolos, ou seja, por ideias erradas e
irracionais.
O
termo Ideologia foi utilizado inicialmente pelo pensador francês Destutt de
Tracy (1754-1836), em seu livro Elementos
de ideologia (1801), no sentido de “ciência da gênese das ideias”. Tracy
procurou elaborar uma explicação para os fenômenos sensíveis que interferem na
formação das ideias, ou seja, a vontade, a razão, a percepção e a memória.
Um
segundo sentido de ideologia, o de “ideia falsa” ou “ilusão”, foi utilizado por
Napoleão Bonaparte num discurso perante o Conselho de Estado, em 1812. Napoleão
afirmou nesse discurso que seus adversários, que questionavam e perturbavam a
sua ação governamental, eram apenas metafísicos, pois o que pensavam não tinha
conexão com o que estava acontecendo na realidade, na história.
Auguste
Comte (1798-1857), em seu Curso de
filosofia positiva (1830-1842), retomou o sentido de ideologia utilizado
por Tracy – o de estudo da formação das ideias, partindo das sensações (relação
do corpo com o meio) – e acrescentando outro, o de conjunto de ideias de
determinada época.
Karl
Marx também não apresentou uma única definição de ideologia. No livro A ideologia alemã (1846), ele se referiu
a ideologia como um sistema elaborado de representações e de ideias que
correspondem a formas de consciência que os homens têm em determinada época.
Ele afirmou ainda que as ideias dominantes em qualquer época são sempre as de
quem domina a vida material e, portanto, a vida intelectual.
Marx
desenvolveu a concepção de que ideologia é a inversão da realidade, no sentido
de reflexo, como uma câmara fotográfica, em que a imagem aparece “invertida”.
Contrapondo-se a muitos autores que acreditavam que as ideias transformavam e
definiam a realidade, Marx afirmava que a existência social condicionava a
consciência dos indivíduos sobre a situação em que viviam. Assim, para Marx, as
ideologias não são meras ilusões e aparências – e muito menos fundamento da
história - , mas são uma realidade objetiva e atuante.
No
mesmo livro de Marx, pode-se encontrar a explicação de que a ideologia é
resultante da divisão entre trabalho manual e o intelectual. O trabalho
intelectual esteve nas mãos da classe dominante e, assim a medida que pôde
“emancipar-se” da realidade concreta em que foi produzido e se transformar em
teoria pura, pôde também transformar-se em teoria geral para todas as
sociedades, sem levar em conta a história de cada uma delas. Essa emancipação
das ideias é muito bem exemplificada por Marx. Ele se refere a um indivíduo que
afirmava que os homens só se afogavam porque estavam possuídos pela ideia de gravidade. Se abandonassem essa
ideia, estariam livres de qualquer afogamento. Marx não diz se esse homem foi
bem sucedido na luta contra a ilusão de gravidade nem se tentou testar sua
teoria.
Emile
Durkheim, ao discutir a questão da objetividade cientifica em seu livro As regras do método sociológico (1895),
afirma que, para ser o mais preciso possível, o cientista deve deixar de lado
todas as pré-noções, as noções
vulgares, as ideias antigas e pré-científicas e as ideias subjetivas. São essas
ideias que ele entende por ideologia, ou seja, o contrário de ciência.
Karl
Mannheim (1893-1947) talvez o sociólogo depois de Marx que mais tenha
influenciado a discussão sobre ideologia. No livro Ideologia e utopia (1929), ele conceitua duas formas de ideologia:
a particular e a total. A particular corresponde à ocultação da realidade,
incluindo mentiras conscientes e ocultamentos subconscientes e inconscientes, que
provocam enganos ou mesmo auto enganos. A ideologia total é a visão de mundo
(cosmovisão) de uma classe social ou de uma época. Nesse caso, não há
ocultamento ou engano, apenas a reprodução das ideias próprias de uma classe ou
ideias gerais que permeiam toda sociedade.
Para
Mannheim, as ideologias são sempre conservadoras, pois expressam o pensamento
das classes dominantes, que visam à estabilização da ordem. Em contraposição,
ele chama de utopia o que pensam as
classes oprimidas, que buscam a transformação.
Depois
de Mannheim, muitos outros pensadores estudaram e utilizaram o conceito de
Ideologia, mas todos eles tiveram como referência os autores que citamos.
por: Nelson Tomazi